terça-feira, 26 de julho de 2011

COLUNA A TARDE: SAMUEL CELESTINO - A REPÚBLICA SAQUEADA



Dois pesos, duas medidas. Se assim for (é preciso aguardar) a chamada “faxina” que a presidente Dilma Rousseff está a fazer ao detonar um processo de varrimento dos corruptos do PR empregados por Lula no Ministério dos Transportes não vai lhe proporcionar os dividendos que está a colher pela coragem de adotar decisões e usar a caneta presidencial. Surgem rumores, muito bem plantados, que ela será “mais cautelosa” com integrantes de sindicatos mais poderosos, como o PMDB, por exemplo.

É fato que o PR, do donatário Valdemar da Costa Neto, anda a ameaçar retaliar o Palácio do Planalto, quando terminar o recreio parlamentar, se quiserem o recesso de julho. Para consertar o País não basta ser séria, como Dilma tem demonstrado, mas ter a coragem de tomar decisões e depurar a República das ratazanas detectadas em suas tocas públicas sem discriminar ou proteger qualquer instituição, partidos, lá o que sejam transformados em sindicato de ladrões.

É de se supor, que as probabilidades de a presidente ter o apoio maciço dos brasileiros na sua faxina são grandes o suficiente para não temer ameaças de “aliado”. O partido que quer ser aliado para roubar não pode ser considerado desse modo nem terá coragem de partir para um enfrentamento porque a população, aos poucos, começa a despertar para a necessidade de uma ação coletiva, de modo a preservar no que for possível o tesouro da República.

Durante a ditadura, sem voz, sem imprensa, sem direitos individuais, os brasileiros conseguiram realizar um movimento com relativo sucesso contra o voto aos partidos “aliados” do regime de exceção. Foi a campanha do voto nulo. Também assim se manifestou o MDB, antecessor do PMDB, transformado, hoje, em geléia geral. O partido fez a campanha da anticandidatura com Ulysses Guimarães à frente, em 1973, tendo ao seu lado, como o anti-vice, o presidente da Associação Brasileira de Imprensa, Barbosa Lima Sobrinho.

Com o discurso “Travessia”, o caçador de nuvens e de sonhos disse à população que “resistir é preciso”, parodiando o “navegar é preciso” do poeta luso Fernando Pessoa. O resultado apareceu nas urnas, no momento mais obscuro da ditadura: das 21 cadeiras em disputa para o Senado, o velho e saudoso MDB elegeu 14. Foi assim, com demonstração de coragem, que os déspotas entenderam que havia uma cidadania que, mesmo amordaçada pela censura, torturada nos porões, sem liberdades individuais, desprovida de habeas-corpus ainda conseguia resistir e Respirava. Dilma Rousseff não só viu e ouviu o que se passava, como participou, combatendo, e sofrendo torturas. Creio que não seria agora o momento de acovardar-se diante de políticos corruptos, interessados em continuar saqueando o povo brasileiro.

O líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), disse que seu partido “está tranqüilo”. E cometeu esta pérola formada pelo cinismo mais abjeto: “A conduta do partido é exemplar. Os nossos ministros estão bem. Tem vários partidos que fizeram indicações técnicas, inclusive o PT. O que ocorreu com o PR é uma questão pontual. Não haverá isso (faxina) em outros ministérios”

Vade retro!

Daqui ando pregar a indignação. Referi-me, várias vezes, à primavera árabe que desmonta ditaduras e derruba déspotas no Oriente Médio e no norte da África. Apenas com a coragem do povo para lutar, usando instrumentos modernos de comunicação como a rede social via internet, mas praticamente desarmados ou com armas tomadas dos adversários que pouco eles sabem usar.

Neste domingo, milhares de manifestantes do grupo "Los Indignados" que protestam na Espanha encontraram-se, mais uma vez, na bela praça Puerta del Sol, centro de Madrid. Grande parte veio de Valencia, mas milhares de espanhóis descontentes com a situação econômica saíram, em grupos, de diversas partes do país. Ao todo, sete levantes chegaram à praça principal de Madrid. Observem que a manifestação tem como causa as dificuldades econômicas que a Espanha enfrenta, e não a roubalheira desembestada que acontece nestes trópicos. Diariamente surgem denúncias, todas envolvendo ou políticos ou apaniguados de políticos aboletados em órgãos da República. Isso acontece também em todas as unidades federativas. Na Puerta del Sol, os manifestantes gritavam e cantavam “Os políticos não nos representam! Não, não, não, eles não nos representam!” E suspendiam cartazes em que diziam: "Não é a crise, é o sistema que está errado".

Aqui também é exatamente assim. Eles não nos respeitam! O sistema está errado! É preciso desratizar o Brasil. Em outros tempos mais românticos, bastava combater as saúvas. Aqui, o presidente da OAB, Saul Quadros, disse-me que as duas principais entidades civis, a OAB e a ABI precisam caminhar juntas e unir, com elas, outras instituições. Creio que o presidente da ABI, Walter Pinheiro, com ele conversará para que as duas entidades se unam nesse propósito.

Para dar sustentação a quem quer combater a corrupção, como Dilma dá demonstrações. Mas, é preciso, também, que conte com o apoio da sociedade e do povo, de modo que não apareça mais nenhum líder como Henrique Alves para dizer que o PMDB está “tranqüilo”.

Tranqüilo, ele e os demais partidos sei que estão. Intranqüila está a República saqueada.

*Coluna de Samuel Celestino publicada no jornal A Tarde desta terça-feira (26).

Nenhum comentário:

Postar um comentário