Com potencial para abrir uma crise com a Câmara, a maioria dos
ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), por 5 votos a 4, determinou nesta
segunda-feira (10) a perda do mandato dos três deputados condenados no
mensalão.
A definição ocorreu com o voto do ministro Celso de Mello
afirmando que a decisão terá que ser cumprida pela Câmara. "Não se pode
minimizar o papel institucional do Supremo", disse.
Isso, no entanto, deve ocorrer apenas quando não houver mais
chance de recursos contra a condenação estabelecida pelo Supremo. A medida tem
efeito para o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e
Pedro Henry (PP), além de José Genoino que deve assumir uma vaga na Câmara no
ano que vem na condição de suplente.
O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), já manifestou que em
sua avaliação a Constituição prevê que a última palavra é do Legislativo e que
uma interpretação contrária a isso representaria uma afronta à autonomia do
Congresso. Para ele, a decisão do STF geraria um "impasse sem precedentes
na história recente da política nacional".
A maioria dos ministros entendeu que uma condenação criminal
transitada em julgado leva à cassação de direitos políticos e,
consequentemente, à perda de mandato.
Com isso, a perda é atribuição do Supremo e cabe à Câmara apenas
formalizar a medida.
Essa linha foi defendida pelos ministros Joaquim Barbosa, Luiz
Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello.
Para Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Dias Toffoli e Cármen Lúcia
deveria ser aplicado o artigo 55 da Constituição que determina que um deputado
ou senador condenado perderá o mandato, mas determina que a decisão cabe à
Câmara ou ao Senado, "por voto secreto e maioria absoluta".
Na avaliação desses ministros, a cassação é da Câmara a, pois se
trata de um juízo político. Eles entendem que a suspensão dos direitos
políticos dos três deputados, conforme foi declarada pelo STF, impede apenas
que eles disputem a reeleição.
A questão foi definida com o voto proferido hoje pelo ministro
Celso de Mello, que nas últimas duas sessões ficou afastado do tribunal por uma
forte gripe. O ministro chegou a ser internado por dois dias com suspeita de
pneumonia, mas, após exames, doença foi descartada.
Para o ministro, é incompatível que uma pessoa condenada tenha
mandato parlamentar. "Não se pode vislumbrar o exercício do mandato
parlamentar por aquele cujo os direitos políticos estejam suspensos",
disse. "Não faria sentido que alguém privado da cidadania pudesse exercer
o mandato parlamentar", completou.
Segundo Celso de Mello, em condenação superior a quatro anos ou em
casos de crime contra a administração pública o Judiciário pode decretar
automaticamente a perda do mandato.
"A interpretação proposta afirma que, nos casos mencionados
de improbidade administrativa contida no tipo penal e em condenação superior a
quatro anos, a suspensão dos direitos políticos poderá ser decretada pelo
Judiciário, por outro lado, permanece às casas legislativas o poder de decidir
sobre cassação em diversos outros casos, especialmente em condenações penais
menores que quatro anos", disse.
Ainda não há consenso entre os ministros sobre uma eventual
punição à Câmara caso não cumpra a determinação do Supremo.
O ministro aproveitou seu voto para criticar, sem citar o nome do
presidente da Câmara, descumprimento de decisões do Supremo. Ele criticou
corporativismo. "Equivocado espírito de solidariedade não põem justificar
afirmações politicamente irresponsáveis, juridicamente inaceitáveis, de que não
se cumprirá uma decisão do STF revestida da autoridade da coisa julgada. As
partes interessadas sempre poderão valer-se dos recursos processuais.
Para ele, a ameaça de descumprir um entendimento do STF é
inadmissível e parte de quem demonstra "não possuir o necessário senso de
institucionalidade".
"A insubordinação legislativa a uma decisão judicial
revela-se comportamento intolerável, inaceitável e incompreensível",
disse.
Com a voz rouca, Celso de Mello disse que o Supremo ainda não
tinha precedente sobre perda de mandato, que classificou de "verdadeiro
litígio constitucional".
A fala é uma resposta indireta às críticas de advogados de réus do
mensalão de que teria mudado radicalmente de posição já que em 1995, quando a
corte discutiu a cassação de um vereador, ele votou no sentido de que o
parlamentar só poderia ter o mandato cassado "por efeito exclusivo de
deliberação tomada pelo voto secreto e pela maioria absoluta dos membros da sua
própria Casa Legislativa".
VOTOS
Segundo Rosa Weber, um parlamentar não pode perder o mandato por
decisão de outro poder, já que foi eleito pela soberania popular.
"Parece tentadora a interpretação do texto constitucional que
subtraia do Poder Legislativo suas responsabilidades políticas e
constitucionais. Mas um regime constitucional democrático imprescinde, a meu
juízo, do reconhecimento, se não da soberania, pelo menos da centralidade
política e institucional do Poder Legislativo, expressão que é da vontade
popular e representa".
A ministra disse que "tratando-se de cassação de mandato, a
competência é do mandante, daquele que o investiu".
A tese de Rosa Weber não prevaleceu. "Se há algo que se
pressupõe no exercício do mandato é a liberdade. Nós temos um deputado preso em
trânsito em julgado. Veja que tamanha incongruência", disse Gilmar Mendes.
"Como alguém condenado a cumprir pena em regime fechado continua com
mandato parlamentar? Isso salta aos olhos".
Em seu voto, Barbosa disse que era preciso levar em conta " a
gravidade deste caso". "O nosso papel é de guardião da Constituição,
nosso papel é dizer o que é a Constituição. Causa-me espécie e desconforto a
perspectiva de dizermos ao congresso nacional que uma pessoa condenada à
privação de liberdade por 10, 14 anos possa exercer o mandato
parlamentar", afirmou.
Revisor, Lewandowski já questionou em outras sessões entendimento
da maioria. "Não estamos acima de outros poderes..Em nenhuma hipótese o
Congresso Nacional poderá rever o que nós decidimos aqui quanto à condenação.
Mas nós, em contrapartida, também não podemos nos intrometer no juízo político
de cassação de mandato", afirmou.
CONDENAÇÕES
Acusado de receber R$50 mil para beneficiar as empresas do
empresário Marcos Valério em uma licitação na Câmara, o petista foi condenado a
penas que somadas chegam a 9 anos e 4 meses de reclusão, mais multa de R$ 370
mil. Ele foi punido por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro.
Como a pena é superior a oito anos, ele terá que cumprir a punição
inicialmente em regime fechado.
Por dois crimes no mensalão, Costa Neto foi punido com 7 anos e 10
meses de prisão, além de multa de R$ 1 milhão. Ele foi punido por corrupção
passiva e lavagem de dinheiro.
Condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, Henry
recebeu penas que totalizam de 7 anos e 2 meses, mais multa de R$ 932 mil.
Costa Neto e Henry, pelo Código Penal, terão que cumprir a pena
inicialmente em regime semiaberto.
Réus condenados a penas entre 4 e 8 anos podem trabalhar durante o
dia e dormir na prisão, mas a definição dos locais em que a sentença será
cumprida dependerá dos juízes que acompanharão a execução das penas.
A lei fala em colônias penais e albergues, mas esses
estabelecimentos são raros e vivem lotados. Na prática, muitos réus acabam
ficando soltos, com algumas restrições, como comparecer em juízo
periodicamente.
Fonte: Folha de S. Paulo
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