UNE recebeu verba para construir
sede, mas projeto está parado. Governo federal depositou R$ 30 milhões em conta da entidade para fazer a
obra.
O lançamento da pedra
fundamental da nova sede da UNE, no Rio, em 20 de dezembro de 2010, foi marcado
por uma grande festa, com direito a palanque e discursos de políticos e estudantes.
O convidado principal era o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Naquela
ocasião, o próprio Lula anunciou a liberação de R$ 30 milhões — de um total de
R$ 44 milhões — para a construção do prédio de 13 andares em um terreno da
Praia do Flamengo, no número 132, na Zona Sul. Até hoje, porém, não há nenhum
sinal de que no local será erguido o projeto desenhado e doado à entidade pelo
arquiteto Oscar Niemeyer, que também estava presente ao evento.
Não foi
fácil avaliar quanto custava este prédio aqui. Chegamos a R$ 32 milhões, depois
a R$ 44 milhões. Nós já depositamos R$ 30 milhões na conta da UNE. Já está
depositado. Ela (a UNE) nunca esteve tão rica como agora. O que vocês estão
conquistando, na verdade, é muito mais do que um espaço para fazer uma sede. Eu
acho que a conquista aqui é um espaço para a consolidação do processo
democrático brasileiro, para o debate político, para a formação da nossa
juventude e para discutir as coisas que o movimento estudantil tem que discutir
— afirmou Lula no discurso, o último dele dedicado a estudantes antes de deixar
a Presidência da República.
UNE diz que obras começam em
agosto
O terreno foi doado à UNE no
governo Itamar Franco. E o dinheiro repassado por Lula a título de indenização
pelos danos sofridos durante a ditadura militar. A antiga sede foi incendiada
pelo regime, em 1964. Dos R$ 44 milhões, R$ 14 milhões que também estavam
previstos para o novo prédio ainda não foram liberados. As obras deveriam ter
começado no primeiro semestre do ano passado, com duração de até dois anos,
incluindo salas de cinema, teatro, museu Memória do Movimento Estudantil e a
administração. À época, os dirigentes também tinham planos de alugar alguns
andares.
Quando a quantia foi
transferida para a UNE, o presidente era Augusto Chagas. Procurado pelo GLOBO
nesta sexta-feira, ele não quis comentar o caso:
Está combinado com a UNE que só
o atual presidente fala. É indelicado eu me pronunciar, não é adequado. Peço
desculpas. Conversa com o Daniel (Iliescu, atual presidente).
Iliescu afirmou que a
construção deverá ocorrer até 11 de agosto deste ano, quando a UNE comemora 75
anos de existência:
Somos uma entidade privada e
não há obrigação legal que define a destinação do dinheiro que recebemos. No
entanto, a diretoria plena da UNE definiu que os recursos serão para a nova
sede. Está no tempo absolutamente razoável. O início das obras será antes do
dia 11 de agosto, quando faremos uma grande comemoração.
Iliescu não explicou o motivo
da demora e destacou que a especialidade da UNE “não é construir prédios”:
Nossa especialidade não é
construir prédios e, sim, debater educação e fazer passeata. Mas temos corpo
técnico que nos deixa confortável para iniciar a obra.
Segundo Iliescu, os R$ 30
milhões estão em uma “conta bancária específica”, que é auditada pelo Conselho
Fiscal da UNE. O Ministério Público Federal abriu uma ação para tentar anular a
doação do terreno alegando que a UNE nada fizera para construir a sede. Mas a
Justiça optou por arquivar o caso, em 2006, diante do compromisso da UNE em
erguer o prédio.
O Ministério do Esporte
informou nesta sexta-feira que já pediu à UNE a devolução integral dos recursos
repassados à entidade, em convênio relacionado à 6ª Bienal de Artes, Ciência e
Cultura, realizada em 2009. Como o GLOBO mostrou, o Ministério
Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) aponta a existência de
indícios de irregularidades graves em convênios do governo federal com a UNE e
a União Municipal dos Estudantes Secundaristas (UMES), de São Paulo.
O procurador Marinus Marsico pediu ao TCU que investigue os repasses.
O convênio do Ministério do
Esporte com a UNE, no valor de R$ 250 mil, foi encerrado em 28 de fevereiro de
2009. Em março de 2012, após já ter prorrogado o prazo de entrega da prestação
de contas, o Ministério do Esporte incluiu a UNE na lista de inadimplentes do Siconv,
sistema que gerencia os convênios da União. Segundo a pasta, a solicitação de
devolução integral do dinheiro foi feita em 23 de maio, um dia antes de o
procurador Marsico protocolar a representação no TCU. O valor restituído deverá
ser corrigido pela inflação do período.
“Considerando que o princípio
da ampla defesa e o prazo para manifestação da parte conveniada foram
garantidos, o Ministério do Esporte procedeu pedido à entidade de restituição
do valor integral do convênio, devidamente atualizado monetariamente nos termos
da Lei”, diz nota divulgada pelo ministério.
Na representação que fez ao
TCU, Marsico registrou a demora do Ministério do Esporte em tomar providências
diante do atraso da UNE em prestar contas sobre o uso do dinheiro público. Segundo
o procurador, a pasta só agiu depois de provocada por ele:
Isso é muito perigoso, porque
envolve uma atuação estrutural dos ministérios, que deveriam agir prontamente.
Só conseguimos pegar essas coisas no tribunal de contas muito depois. E aí o
prejuízo já está bem maior — disse Marsico ao GLOBO.
Não há investigação no TCU. O
que existe é um pedido de um procurador para abrir uma investigação. O TCU, por
enquanto, não se posicionou. Desde 1999, fazemos convênios com o governo. Todas
as prestações de contas foram aprovadas. Não há irregularidade. Estou à
disposição para esclarecer. Posso dizer que não houve má-fé. Agora, se houve
uma imperícia técnica, tomaremos as medidas cabíveis, como devolver os recursos
— afirmou Iliescu.
Priscila Casale, presidente da
União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo (UMES), negou que a
entidade tenha usado recursos do governo federal indevidamente ou entregue
notas fiscais frias na prestação de contas.
Nunca tivemos problemas com a
prestação de contas. Celebramos convênio com governo federal, estadual e
municipal há um bom tempo. Confiamos no nosso trabalho — afirmou Priscila.
Fonte: O Globo
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