Em entrevista ao CORREIO, o prefeito eleito de Salvador, ACM Neto, elenca
as prioridades para o início de sua gestão e revela que, além das ruas,
implantará medidas de choque de ordem também para os servidores públicos da
prefeitura
Às vésperas de assumir a prefeitura da capital,
ACM Neto (DEM) vive dias movidos a convicções e segredos. Tem certeza de que a
população sentirá de imediato a chegada de um novo governo, através de um
conjunto de medidas que entrará em vigor já em 2 de janeiro, a maioria delas
mantida em sigilo. Em entrevista ao CORREIO, porém, deixou escapar qual o foco
para o início de sua gestão: melhorar a qualidade do serviço prestado pela
prefeitura ao cidadão, limar o desperdício da máquina pública para aplicar na recuperação
financeira da cidade e implantar uma política de endurecimento contra a
desordem urbana em Salvador.
De que forma a população de Salvador vai saber que
tem um novo prefeito?
Acho que, de alguma
maneira, a cidade já vem percebendo uma mudança na condução das coisas. As
posições que a gente vem adotando, seja no campo político, seja na reforma
administrativa, na escolha dos nomes, deram uma demonstração clara de
mudança de postura em relação à condução que foi dada nos últimos anos. Desde o
primeiro dia, vamos trabalhar de maneira incansável para organizar a cidade.
Tenho evitado prazos, porque, às vezes, você se preocupa com ações imediatas,
da chamada ‘perfumaria’, mas que depois não se sustentam. Minha preocupação é
tomar medidas que possam reverter o quadro atual de Salvador a médio e longo
prazos. Não vou buscar o caminho mais fácil, vou buscar sempre o melhor caminho
para resolver problemas da cidade.
Então, quer dizer que não haverá, a princípio, uma
marca de grande visibilidade...
Ah vai! Sobretudo
haverá uma sensação clara de mudança de postura na gestão. É a primeira coisa
que vamos fazer. No dia 2 de janeiro, vou baixar um conjunto de decretos para
disciplinar áreas da prefeitura. Já estamos trabalhando para que, logo no
início, a gente comece a melhorar a qualidade dos serviços públicos, a
desenvolver projetos, a investir na recuperação da infraestrutura. Desde o
primeiro dia, a cidade vai ter a clara percepção da chegada de um novo governo.
Quais decretos afetam
diretamente a vida do cidadão?
Há decretos que vão
tratar, por exemplo, dos funcionários da prefeitura. Outros criam grupos de
trabalho para implantar, em determinado prazo, as prefeituras-bairro, o bilhete
único, a meia- passagem aos domingos.
Há decretos voltados ao chamado
choque de ordem, ao ordenamento da cidade?
Não precisa de
decreto para isso. O que há é decisão política e uma determinação dada aos
secretários Rosemma Maluf (Ordem Pública) e José Carlos Aleluia (Urbanismo e
Transporte) para se cumprir a ordem e a lei. Isso vai ser uma característica
dessa gestão. A população vai ver que, a partir de certo momento, vamos começar
a rebocar e multar carros estacionados em lugar proibido. Também vamos
trabalhar para evitar a sujeira que prolifera em Salvador. Mas é claro que os
efeitos não serão vistos a curto prazo.
Por quê?
Uma coisa a gente já está sentindo: vamos ter que
mexer nos brios dos servidores do município. Se você olha para a área de
trânsito, percebe que a Transalvador, para dar um exemplo, é um organismo
desestimulado, onde as pessoas não têm um bom ambiente de trabalho. Como é que
você espera que essas pessoas cumpram seu dever sem que antes exista o
restabelecimento do bom ambiente. Vamos ter que trabalhar nisso, em todos os
órgãos.
O senhor falou que haverá
decretos para o funcionalismo. Eles determinam mudanças no atual regime de
trabalho dos servidores, na carga horária?
Não vou ficar antecipando, dia 2 de janeiro vocês
vão saber (risos). Mas posso usar como exemplo o caso da Guarda Municipal. Não
é possível que ela trabalhe em um regime de 12 por 60 (no qual o servidor
cumpre um turno de 12 horas e folga nas 60 horas seguintes). Por isso não se vê
a Guarda na rua. Não é possível que se tenha, como hoje, uma quantidade muito
grande de professores fora da escola. Lugar de professor é na escola. Lugar de
médico é trabalhando na Saúde. Atualmente, há um conjunto de servidores
reposicionados fora de seus órgãos, comprometendo a qualidade do serviço
público. Mas se, por um lado, vamos cobrar, por outro lado teremos uma política
de valorização dos servidores, que virá também nesse conjunto de decretos.
Haverá mudanças no modelo de
remuneração para servidores e ocupantes de cargos comissionados?
Cada coisa a seu
passo. Vai ser dado prazo para cada secretaria definir seu planejamento
estratégico. Quando isso estiver definido, com metas estabelecidas, vamos fazer
um acompanhamento de resultados. Esse trabalho virá acompanhado de uma política
de remuneração pela chamada meritocracia. Quem bater metas, ultrapassar
resultados previstos, vai ser melhor remunerado.
Do ponto de vista da
administração, sabendo de suas restrições orçamentárias, como tocar projetos
importantes, como é o caso da organização da orla?
Aposto muito na competência do secretário Mauro
Ricardo (Fazenda). No começo, vamos ter que trabalhar com uma política de
austeridade, operando com a lógica de gastar menos com a prefeitura para gastar
mais com a cidade. Todas as nossas previsões indicam que as medidas mais
consistentes só vão surtir efeito a partir de 2014, do ponto de vista da
elevação da receita. O que vamos fazer a partir do próximo ano será fruto de
duas coisas: economia, ou seja, gastar menos, mas gastar melhor; e criar
projetos para buscar apoio do governo federal e linhas de financiamento.
Por conta do orçamento apertado, existem áreas que terão prioridade de recursos?
A cidade é como um
ser vivo, com muitas coisas que estão no mesmo nível de hierarquia. Logo, não
vamos começar enfrentando uma só vertente. Mas a prioridade é melhorar os
serviços públicos essenciais da prefeitura, especialmente nas áreas mais pobres.
De quais serviços o senhor
está falando?
Vamos lá! Posto de saúde que não funciona, a
prioridade é colocar para funcionar. Ampliar a limpeza, a presença da Guarda
Municipal. O primeiro ano será para arrumar a casa, organizar a gestão, criar
condições para que a prefeitura possa ter saúde financeira e, óbvio, melhorar a
qualidade dos serviços públicos. Vai ser um ano difícil, mas acho que as
pessoas têm consciência de que não será possível resolver as coisas da noite
para o dia.
Metas como a dos postos de saúde, onde é preciso investir, vai dar para colocar
em prática logo no início, levando-se em conta a falta de recursos?
Algumas metas e
medidas emergenciais vão ter efeito mais imediato; outras vão demorar um pouco
para vermos resultados. É mais fácil sentir efeitos rápidos na área de limpeza
do que na de trânsito, mas todo o conjunto de ações de emergência será colocado
nos primeiros dias. O começo vai ser duro, puxado, para eliminar desperdício,
tirar gordura, economizar com o que a prefeitura já arrecada. Esse será o
dinheiro para as ações emergenciais.
Já há um horizonte para tirar
Salvador do cadastro de inadimplentes?
Foi feito um
esforço da Procuradoria do Município junto à Justiça Federal, que foi muito
sensível e entendeu que há uma mudança de gestão, um compromisso de regularizar
a situação da prefeitura. Com isso, a Justiça abriu condições para que uma
série de recursos federais fossem já empenhados para o município. É o caso dos
recursos para viabilizar o início da recuperação da orla, no trecho da Barra.
Recentemente, o senhor se
reuniu com o juiz federal Carlos D’Ávila para tratar da questão da orla. Houve
avanço?
Primeiro, sinto que
há equilíbrio, boa vontade e, mais do que isso, uma posição muito responsável
da Justiça. Conversamos com o grupo de pessoas da sociedade que foi criado para
dar suporte a uma futura decisão judicial sobre a orla. Determinamos, já para
janeiro, uma reunião com a equipe de governo, para que se comece a trabalhar em
cima dos pontos que impedem o entendimento entre o município e a Justiça, para
liberar a instalação de novos equipamentos na orla.
A nomeação do diretor de teatro Fernando Guerreiro para a Fundação Gregório de
Mattos significa uma mudança no perfil de atuação na área cultural?
A Fundação Gregório de Mattos - com todo respeito
que tenho pelas pessoas que trabalham ou já trabalharam lá – não tem condições
nem suporte para fazer uma política cultural séria. Assumi na campanha o
compromisso de dar muita importância para a cultura. Há quem, de forma
equivocada, acha que investir em cultura é gastar dinheiro público. Não é. Isso
é investir dinheiro público. Tive a firme decisão de criar uma secretária que
pudesse ser a “culpada” tanto por entender o desenvolvimento econômico da
cidade quanto por enxergar o turismo e a cultura nos seus aspectos tradicionais
e como elemento de crescimento. Fernando é um ícone da cultura, uma pessoa
extremamente criativa, com grande capacidade de mobilização. A fundação será
outra com a gestão dele. Dei a ele autonomia para conduzir um trabalho
transformador e blindado de influência política.
E como será a atuação junto ao
setor de entretenimento?
O setor de entretenimento é uma coisa, o setor
cultural tradicional é outra, mas na minha opinião, de alguma maneira, devem
ser vistos de forma conjunta. Um desafio é fazer com que a cidade tenha uma
agenda de eventos o ano inteiro. O que só vai acontecer quando sairmos dos
limites do Carnaval. Ele é o maior, mas o calendário de eventos não pode se
concentrar apenas de dezembro a fevereiro e não pode ter apenas no Carnaval o
seu elemento motor. Haverá uma empresa para cuidar do calendário, que deverá
ser a sucessora da Saltur. Queremos que o calendário seja amplo e
diversificado, que aproveite a pluralidade e a vocação artística do povo
baiano.
No caso do metrô, o que falta
para fechar o acordo com o governo do estado?
As conversas estão
avançando bem. Minha expectativa é a de que a gente possa concluir tudo nos
três primeiros meses de 2013. Não quero passar muito disso.
Fonte: Correio da Bahia